Migrantes e Integração

Num grupo de trabalho sobre trabalhadores sexuais e direitos dos migrantes não documentados, estávamos tentando arranjar consenso sobre recomendações a serem feitas afim de minimizar os riscos a que estão expostos e as dificuldades de acesso ao SNS.
Normalmente nestes grupos por vezes há intervenções que parecendo não estarem interligadas à problemática da SIDA e prevenção acabam por nos elucidar sobre o problema.
Ás vezes os intervenientes no seu discurso têm objectivos e querem ser ouvidos mas mostram outros problemas que deveriam ser tratados noutros grupos que podiam ter impacto para a resolução do problema.
Numa dessas intervenções recordo a de uma senhora brasileira que disse viver há muitos anos em Portugal. Considerando o seu discurso como a voz de um migrante deslocado do seu país e aquilo que sente no país de acolhimento, vi que havia dois sentires diferentes. O primeiro relacionado como os portugueses viam a comunidade brasileira residente em Portugal, e por certo isso incomodava-a. O segundo ponto que referiu era a falta de comunicação dos portugueses em falarem de certas coisas como por exemplos serem doentes de SIDA. Aqui trouxe um exemplo pessoal de uma tia que morreu de SIDA e em que falavam livremente sem qualquer inibição.
Quanto ao primeiro ponto em que ela dizia os portugueses verem as brasileiras aqui residentes como trabalhadoras de sexo, que eram mais quentes etc. etc.o que não exprimia a realidade compreendo-o e acho legitimo o seu mau estar se ela ou a comunidade a que pertence sentir isso.
Pessoalmente e como Português, não representando de forma nenhuma o pensar dos portugueses, sei que há muitas prostitutas/os brasileiras no nosso país, garotas de programa e tenho ouvido falar do seu bom desempenho nas relações sexuais, mas de forma nenhuma vejo a comunidade brasileira como uma migração de fazedores de sexo quente e de qualidade.
Tenho amigos brasileiros que estão cá para tirar mestrados e licenciaturas nas nossas faculdades com bolsas de estudo, outros que desempenham funções como médicos, psicólogos e outras distintas posições como a administração da nossa TAP ou como o Guia da nossa selecção de futebol . Outros são jogadores de futebol que até se naturalizam portugueses sem no entanto deixarem a sua cultura e sotaque para trás continuando a ter o Brasil no coração. Também conheço gente mais simples que trabalha nas obras , barbeiros e cabeleireiros e até pessoas que fazem limpeza de casa ou estão ao balcão de uma qualquer pastelaria.
Creio não ser o único a ver assim a comunidade migrante brasileira no nosso país, e se a senhora se sente mal pelo que referiu sem citar quem pensa assim citando a generalidade da população portuguesa eu sinto-me mal também por ser português e estar englobado na acusação que faz, sentindo-me pessoalmente ofendido.
Afinal de quem é a culpa se na realidade esse pensar ou mito existe? Eu gostaria e seria excelente se um dia me falassem de uma comunidade que é vista como os grandes impulsionadores do progresso português a nível cientifico e tecnológico. Certamente isso seria um motivo de orgulho para uma senhora como esta e para muitos outros que pensam da mesma forma.
O segundo ponto é mais agradável e até é engraçado em que nos acha muito fechados na comunicação. Eu achei-o engraçado precisamente por ser uma reclamação e um esforço para nos unir em cultura e modo de estar na vida. Claro que nunca seremos no nosso modo de ser, iguais aos brasileiros quer devido ao clima, quer ao nosso passado histórico recente em que fomos oprimidos e ainda nos sentimos um pouco assim. O bom, é que é óptimo se adquirirmos algo do modo de ser e de vida das comunidades migrantes que vivem connosco e se nos modificarmos um pouco sem perder as nossas raízes culturais. Era bom ao nos perguntarem como vamos dizer algo diferente do lá se vai indo. O problema e talvez mais para os que estão entre nós é que o inverso também pode acontecer e isso talvez não gostem, mas faz parte do jogo do dar e receber. Engraçado que sem conhecer antes do workshop a senhora, ela pareceu-me um tanto austera e pouco comunicativa. Será que encarnou aquilo de que nos acusa? Mas se não gosta que sejamos assim porque razão ela passa essa imagem mesmo sem se aperceber disso.
A imagem do português emigrante do passado que ia para o Brasil ainda hoje é associada ao padeiro e as suas mulheres as saloias com saias que vemos nas nossas danças de folclore. Os tempos mudaram mas a imagem ficou e persiste para muitos brasileiros e do lado de fora nós sentimos que é assim que nos vêm mas nem por isso vamos clamar que estamos a ser discriminados por esse motivo. Também não vamos acusar os brasileiros dizendo que nos vêm assim. Os portugueses no Brasil mudam o sotaque e quando cá vêm notam-se modificações em hábitos e no modo de falar. É bom que assim seja pois isso mostra integração na sociedade em que vivem. Esperemos que o mesmo aconteça aos que estão vivendo entre nós e que adquiram algo da nossa cultura e costumes. Não precisamos que falem mal de nós como povo, mas sim que contribuam para que aquilo que temos de menos bom se transforme em bom.
Acima de tudo o importante é que lutemos para que as comunidades que escolhem o nosso país para nele viverem, se sintam bem entre nós e que tenha, direitos iguais aos portugueses no que diz respeito à saúde e segurança social. No caso dos trabalhadores do sexo é bom que possamos chegar até eles e mostrar os riscos a que estão sujeitos pois issso é um trabalho de prevenção no que diz respeito ás DST nomeadamente o HIV e HCV. Quando infectados é bom que tenham os mesmos direitos ao serviço nacional de saúde que os nativos nacionais têm.
É bom vermos as nossas crianças nas escolas de cabelos louros e olhos azuis ou de pele negra e falando outra língua com os amigos da mesma origem e o português com os colegas que os não entendem. Eles são os novos portugueses e é bom que os vejamos como tal.
Uma sociedade multi facetada de diferentes origens deseja-se e faz parte do esforço para uma mescla mundial de diferentes raças e origens. Afinal a aldeia global está a formar-se em todo o mundo.
Vamos esquecer os diferentes etnias e nações e vamos integrar os migrantes como integramos os que vêm da Madeira. Açores ou trás- os- montes e aparecem no nosso bairro. Vamos integrar o bom da sua cultura e deixá-los assimilar a nossa também.
Talvez isso seja uma gota de água no universo da pluralidade dos povos, mas sem dúvida contribuirá para que onde quer que vamos , possamos sentir que estamos um pouco em nossa casa e que o planeta terra é a origem de todos nós.

2 comentários:

Anónimo disse...

Boa tarde,

Parabéns pelo blog. Costumo vir aqui espreitar mas so desta vez resolvi participar apenas para mostrar o meu desagrado pelo que me aconteceu no site que sei que tão bem conhece. aidsportugal.com
Coloquei uma participação mostrando a minha indignação e até hoje não obtive qualquer resposta.
Aqui deixo:

Caro Dr. Victor Bezerra

Esta minha participação no fórum é inteiramente dirigida a si.
Sou frequentadora e leitora assídua do vosso site e desde já os meus parabéns pelo trabalho desenvolvido.
Como tudo que é bom na vida há contudo questões que não posso deixar passar em vão sem me manifestar.
Nas perguntas e respostas de especialistas online tive oportunidade de ver a sua resposta a uma Pergunta colocada por NP em 2007-07-09
Li atentamente a sua resposta numerada por Tópicos de 1 a 4 utilizando transcrições das referidas questões colocadas por NP.
Não me considero uma supra sumo da literatura mas confesso que tenho alguma aptidão para entender o que leio.
No entanto, estive cerca de 15 minutos a ler e reler a sua resposta ás questões de NP e confesso que tive bastantes dificuldades em decifrar as suas respostas em forma de código.
Qual não o é o meu espanto quando vejo a forma como termina as respostas no tópico 4:
“4- Se é curioso destas matéria é importante estudá-las...mas se calhar a sua verdadeira vocação é a filosofia...”

Agora pergunto: Será que NP ao colocar as questões num site indicado para tal afeito não estará a estudar a matéria?
NP ter-se ia identificado quando colocou a sua participação como sendo professor, medico, contabilista ou outro ramo qualquer como por exemplo Filosofo?
Estaremos nós a assistir a alguma “guerra” entre NP e Dr.? (Coisa que nos ultrapassa como leitores)
Um site que contem fórum e questões online dirigidas por um ou vários moderadores que ultimamente se tem limitado a remeter as questões pela Administração, para Perguntas Semelhantes.
Como disse anteriormente sou leitora assídua deste site e já vi muitas respostas suas que me deixam de uma certa forma estupefacta tentando entender o porquê.
Sei o quanto é difícil nos dias que correm ser imparcial e manter toda a calma e profissionalismo principalmente em questões complexas como a do HIV, contudo gostava de manifestar o meu total desagrado pelo seu humor negro, o seu cinismo, autoritarismo e pela forma leviana como por vezes responde.
Gostaria para terminar reforçar a ideia de que esta minha participação deve-se sobretudo a focar dois pontos.
Em primeiro lugar parece-me que NP ao colocar a questão está a estudar e apenas a procurar informação. (se existe algo em contrario eu como leitora não o sei)
Em segundo lugar pedir para que leia a sua resposta a NP e se coloque no lugar não apenas de NP mas de uma pessoa com menos instrução, que tenha entrado no site e se depare com uma resposta com palavras tão rebuscadas e difíceis de decifrar.
Afinal quem é o Filosofo Dr. Bezerra?

Continuarei sempre a consultar o site da aidsportugal considerando que é o melhor site que conheço a nível nacional como busca de informação diária.
Gostaria muito de obter uma resposta sua.

Atentamente
Luísa Cunha

É caso para dizer... e esta heim?

Cumprimentos

Anónimo disse...

Olá Luisa
Obrigado pelo seu comentário no blog do "Sidadão".
Não conheço bem o site como diz, pois as coisas mudam e hoje raramente e só em momentos de nostalgia lá vou para ver como o site está.
Utilizava o nick "Watcher", escrevia regularmente no fórum, participava nos positivos on line e também fui utilizador do chat durante alguns anos.
Tenho boas recordações do site fiz lá bons amigos que perduram, e alguns inimigos também como não podia deixar de ser.~
Não li o artigo nem as respostas, mas se tiver tempo prometo dar uma volta por lá.
Como vê o blog está práticamente sem actividade e não é por falta de matéria para publicar.
Nós amadurecemos, evoluimos e vamos aprendendo. A minha luta pela causa da sida continua e alargou-se a outras frentes como a tuberculose e as hepatites virais, pandemias associadas aos infectados pelo HIV,e à dificuldade destes nos tratamentos.
Fique bem e vá aparecendo pelo blog, se quiser fazer perguntas estou à sua disposição e responderei se souber.
Cumprimentos