Frederico "O Jogador"

A história que vos vou contar, foi-me contada por um amigo sidoso num período em que o espectro da morte pairava sobre mim e ocupava todos os meus pensamentos. Fez-me bem na altura e ficou marcada. Já se passaram uns anos e eu lembro-me basicamente do essencial embora não a consiga contar toda com a riqueza de pormenores que tem. Resolvi telefonar a esse amigo para a reavivar e ele contou-me parte dela aceleradamente, mas não o final pois um problema logístico com a cadela lá de casa fez com que o telefonema fosse interrompido.
Aqui fica o essencial: Chamava-se Frederico, homem rico que arranjou a sua fortuna jogando às cartas. Tinha sorte ao jogo e ganhava sempre, sendo um boémio que desfrutava a vida com todos os prazeres da mesma. Um dia jogou com 4 jovens tendo-os arruinado, levando com que se dedicassem ao banditismo para poderem viver como até então. Foram apanhados pela policia real e condenados à morte. A execução destes quatro jovens, ficou na consciência de Frederico, que se sentia culpado pela desgraça dos mesmos. Mas continuou a sua vida de orgias. jogo e boa vida até que um dia a sorte começou a faltar e teve de deixar o jogo.
Restava-lhe a sua casa com a sua bela lareira e um jardim onde havia uma laranjeira sempre carregada de suculentas laranjas , o seu fiel criado que nunca pensou em o abandonar mesmo estando na ruína, e pouco mais.
Numa noite fria de inverno, estava sentado à lareira, brincando com o seu baralho de cartas e relembrando a vida que tinha tido e moendo a culpa que sentia pela morte dos quatro jovens que tinham ido para a desgraça e depois para a morte, por perderem ao jogo com ele, quando ouve bater à porta. Chovia muito e a noite estava muito fria. Eram 3 foragidos ou talvez romeiros . Acolheu-os e convidou-os a sentarem-se à lareira para se aquecerem e mandou que o seu criado matasse o seu último carneiro e fizesse uma boa refeição para todos.
Sentaram-se à mesa e começaram a comer, e ele pediu ao seu criado que servisse o resto de vinho que ainda havia embora estivesse já um pouco azedo, pelo que pediu desculpa aos seus hóspedes mas era o único que tinha e contou-lhes a sua vida passada.
Ao provarem o vinho os hóspedes, comentaram que era excelente e que ele o provasse pois era mesmo um bom vinho. Ele assim fez e realmente o vinho tinha-se tornado muito bom, talvez do melhor que já tivesse bebido.
Todos comeram e beberam bem e até sobrou para a cadela “Vesga” que em conjunto com o criado eram a única família de Frederico.
Depois do Jantar os romeiros tinham de prosseguir viagem, mas antes de se irem embora revelaram-se e eram Jesus e dois dos seus apóstolos que eram Pedro e Paulo.
Jesus disse a Frederico que escolhesse três desejos que lhe seriam concedidos. Pedro aconselhava Frederico a que escolhesse a salvação da alma. Paulo dizia-lhe para pedir sabedoria e conhecimento, enquanto Jesus aguardava os 3 pedidos.
Frederico não estava muito inclinado a seguir o conselhos de Pedro e Paulo e tomou a decisão de fazer os pedidos à sua maneira.
-Senhor eu quero ter o dom de ganhar às cartas sempre que jogue com um baralho.
Jesus concedeu-lhe o desejo e perguntou-lhe quais eram os outros dois desejos.
Ele pediu que quem se sentasse à sua lareira só se pudesse levantar se ele o permitisse e também que quem subisse à laranjeira que tinha no quintal só pudesse descer se ele quisesse.
Jesus achou estranho mas concedeu-lhe os seus desejos, despedindo-se a seguir e desaparecendo na noite com Pedro e Paulo.
A vida continuou a decorrer o melhor possível para Frederico que recuperou e aumentou a sua fortuna, mas sempre preocupado pelas mortes dos quatro jovens que caíram em desgraça devido a perderem ao jogo com ele.
Um dia descobriu onde era a entrada para o inferno. A preocupação que tinha em relação aos quatro jovens , levou-o a decidir entrar para resgatar as suas almas do fogo do inferno. A entrada estava a ser guardada por um cão de 3 cabeças, que devorava todos aqueles que lá quisessem entrar. Frederico era um homem decidido e arranjou maneira de contornar esse difícil obstáculo. A sua cadela “Vesga” estava com o cio e ele largou-a junto ao terrível cão de 3 cabeças. Enquanto este estava ocupado com a cadela não lhe poderia fazer mal e ele conseguiu entrar. Havia outros obstáculos como rios de fogo e precipícios, mas ele conseguiu entrar e chegar a Satanás que era o chefe do inferno. Propôs a Satanás ter com ele um jogo de cartas em que se vencesse, Satanás lhe daria algumas almas e caso perdesse era a sua própria alma que dava a Satanás. O Jogo começou e claro como vencia sempre resgatou as almas dos quatro jovens e queria continuar a resgatar almas. Satanás que estava a perder e furioso, disse-lhe para continuarem o jogo fora do inferno pois estava muito calor lá dentro.
Mal saíram as portas do inferno Satanás, fugiu e reforçou a guarda dando ordens expressas para que Frederico nunca mais lá pudesse entrar.
Estava tranquilo, pois tinha resgatado as quatro almas e Frederico voltou á sua vida normal e estava velho e cansado . Um dia estava ele no jardim de sua casa à sombra da laranjeira que tinha no local, quando lhe apareceu a morte vestida de negro, dizendo-lhe que o vinha buscar, pois os seus dias de vida tinham acabado. Não se preocupou e muito calmo preparou-se para a acompanhar. A morte estava avisada por Satanás para não jogar com ele ás cartas, e achou que ele estava farto de viver e que a acompanharia facilmente pois não estava a apresentar qualquer problema em a acompanhar.
Estavam para partir, e Frederico disse para a morte: - Estou velho e cansado, mas vou-te pedir um favor antes de partirmos. Sobe a esta laranjeira e colhe algumas laranjas para eu poder desfrutar pela última vez dos frutos tão doces que ela dá. A morte não viu qualquer inconveniente e lá subiu à laranjeira para colher algumas laranjas.
Se leram com atenção a história saberão que lhe tinha sido dado o dom de que quem subisse á laranjeira só desceria quando ele quisesse. A morte bem que esperneava mas Frederico continuava cá em baixo sereno e impávido sem se preocupar. Conseguiu negociar com a morte que o deixasse por cinco anos e depois voltasse para o levar pois ainda não estava preparado para partir. A morte partiu em busca de outras almas, e Frederico dedicou-se a ajudar todos aqueles que tinham necessidades e sofriam. Tão ocupado estava que nem se apercebeu que os cinco anos que havia negociado com a morte passaram.
Era uma noite fria de inverno, com muita chuva e Frederico estava sentado á lareira para desfrutar do agradável calor que emanava da fogueira, quando bateram á porta.
Era a morte de novo, que chegou toda molhada e cheia de frio e que lhe comunicou ao que vinha pois os cinco anos tinham passado. Com a maior serenidade olhou para ela e concordou. Pediu ao seu criado para servir um café bem quente á morte e convidou-a a sentar-se á lareira um pouco antes de partirem, convite este que foi bem aceite por esta, pois estava a tiritar de frio e decidiu aquecer-se um pouco enquanto esperava pelo café.
Ao sentar-se a morte, deixou de poder-se levantar pois esse era outro dos dons que tinham sido dados a Frederico.
Aqui interrompo a história, deixando lá a morte sentada á lareira, mas prometendo vir a saber os pormenores do final da história um dia destes.
Que cada um de nós, portadores de doenças como a Sida, Cancros, Hepatites e outras , possa ser um pouco como Frederico o jogador que jogava com a morte. Vamos viver um dia após outro com coragem e ajudando quem precisa, a passar as crises. Uma vida só merece ser vivida se a pusermos ao serviço de quem precisa de nós.
Até breve amigos.

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