Dia Mundial da Sida ou dos Sidosos?

Ontem foi o dia mundial da Sida, se é que se pode atribuir um dia a uma doença que todos os dias e não só ontem, continua a fazer vitimas .
Um slogan “Por um mundo sem Sida: manter o compromisso”, discursos com as linhas orientadoras para os próximos 3 anos, com o programa da prevenção.
Entregas de prémios de um concurso, spots para prevenir a infecção, visitas a um centro que trabalha nesta área e a apresentação dos embaixadores da SIDA.
A comunicação social tinha obrigatoriamente que estar presente, como é óbvio ou não haveria razão para a Comemoração.
Parece-me não estar errado, se afirmar que todos reconhecem a SIDA como sendo um problema social, que leva os infectados a uma desintegração da comunidade em que se inserem, e a serem marginalizados muitas vezes até pela própria família.
As intenções proclamadas de cuidados continuados aos sidosos para além do hospital, incluindo o apoio domiciliário extensivo ás famílias e mesmo refeições afinal onde estão elas?
Para mim e para milhares de outros sidosos no nosso país e milhões no mundo inteiro, dia da Sida são todos os dias do ano em que vemos o sol nascer e pôr-se com as nossas angustias, as nossas dores e consequente sofrimento, para além da revolta constante por não podemos escapar do fundo deste poço em que nos encontramos sem que haja alguém que nos possa lançar uma corda salvadora.
A minha comemoração é por estar vivo por mais um dia para poder tomar as drogas que me dão para sobreviver, saber quando vou tirar sangue para análises e enfrentar uma fila de dezenas de utentes que por vezes não cabendo lá dentro ficam á chuva ou ao sol fora do edifício, sem condições para receber um tão elevado numero de doentes. É ir á farmácia hospitalar ou ás consultas onde a cena se repete e depois voltar para casa onde a rotina do passar dos dias é sempre igual. É continuar a comemorar todos os dias sem que isso no entanto me faça feliz.
É bom continuar a haver comemorações e é por isso que eu continuo a comemorar cada dia em que vejo o sol nascer e pôr-se com a rotina diária de uma vida que não tem muito para festejar mas que nem por isso deixa de ser vida. Um dia deixar-me-ei destas comemorações, e em antecipação já estou comemorando o dia do apagão em que finalmente deixarei de ter esta infelicidade crónica , comum a milhares ou milhões de infectados pelo HIV.
A SIDA não é o problema, a VIDA com SIDA é que realmente o é.

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