M e d o s



O ser humano raramente pensa na morte a não ser quando é confrontado com ela, ou pela morte de alguém próximo ou quando lhe é diagnosticada uma doença grave. A sida tem um grande impacto psicológico porque combina três conceitos com enorme carga emocional: o facto de ser uma doença incurável, de poder levar à morte prematura e ser adquirida/associada a comportamentos reprováveis pela sociedade.



A sida é uma doença altamente associada à morte, sobretudo na era pré TARGA (terapia anti-retroviral de grande actividade) em que praticamente não havia nada a fazer pelos doentes. A partir de 1996 com a introdução de novos fármacos, o panorama alterou-se sendo que hoje em dia é possível prolongar e aumentar a qualidade de vida dos infectados.

As respostas observadas na infecção pelo VIH assemelham-se a outras doenças como as neoplasias. No entanto, o impacto emocional desta infecção implica uma série de condições sociais estigmatizantes com influência nas reacções perante a doença e tornando-a numa realidade particular. Estas reacções podem variar desde emoções fortes mas sem psicopatologia (surpresa, choque, angústia, negação) até respostas patológicas como comportamentos suicidas e depressão major.

Kübler-Ross foi uma das pioneiras a descrever as reacções perante o diagnóstico VIH ainda na era pré-TARGA: negação, isolamento, raiva, negociação, depressão e aceitação.
Com o advento da TARGA, a doença VIH tornou-se numa infecção crónica. No entanto, esta percepção ainda não foi assimilada pelo público em geral. Alguns autores argumentam que os doentes quando recebem o diagnóstico continuam a reagir da mesma forma que as pessoas na era pré-TARGA. A ideia da SIDA como sinónimo de morte ainda se encontra presente no imaginário colectivo.

O diagnóstico do VIH desperta o medo da morte. Este medo é mais intenso na fase inicial e tende a diminuir com a passagem do tempo. Muitos superam esta fase e experienciam uma redução da ansiedade e do medo à medida que vão adquirindo mais conhecimentos sobre a doença e pelo contacto com outros infectados. No entanto, a reacção do indivíduo depende em grande parte da sua história pessoal, da própria personalidade e do suporte social e afectivo.
No limite, quando uma das reacções é a desistência, é importante ajudar o infectado a perceber que embora a sida seja incurável, tem carácter cada vez mais crónico sendo possível viver muitos anos com relativa qualidade de vida desde que haja boa adesão ao tratamento.







Há que substituir da mente a ideia “morrer de sida” por “aprender a viver com sida. "

E finaliza-se com uma citação do livro “Testemunhos VIH/SIDA” da CNLCS “Ter SIDA não é ter fim... Viver é também morrer lentamente” (Afonso Pedro, 1998).



(Com a colaboração de Isabel Pinto)

14 comentários:

Alexa disse...

Raul:
Fica sempre afrase aprender com Sida.
E realmente viver é também morrer lentamente.

Um Abraço
cheio de força

Alexa disse...

Raul: Desculpa o 1º comentário o que eu te queria oferecer eram estas 2 frases "Há que substituir da mente a ideia de morrer com sida e ter sida não é ter fim ...Viver também é morrer lentamente

um abraço cheio de força

Fatyly disse...

Um grande testemunho...uma grande mensagem!

Um abraço e continua com a tua garra na transmissão de valores e sabedoria

sideny disse...

Raul

Ainda existe muito essa ideia de que se vai morrer.

Até cpm uma neoplasia se pode viver
isto se ela for dectatada a tempo
e a tanto casos assim(ainda bem)

Mas viver mesmo sem doenças é sim morrer lentamente.

beijocas

sideny disse...

As fotos sâo muito bonitas.

beijocas

SILÊNCIO CULPADO disse...

Raul

A morte existe em cada ser humano o que varia são as representações que temos sobre a forma de morrer. O conceito de finitude dá-nos um impulso apressado em aproveitar o tempo porque sabemos que, a qualquer momento, pode surgir um acidente que nos prive desse bem precioso que é a vida.
Também à medida que vamos galgando os anos vamos vendo desaparecerem pessoas que amámos porque a vida é isso mesmo um somatório de perdas sucessivas.
Mas a vida é também ganhos fabulosos que podem ser sentidos sempre que uma batalha é vencida.
E tu, meu velho guerreiro, já venceste muitas batalhas e deverás ter orgulho por o teres conseguido. O tempo psicológico pode prolongar exponencialmente o tempo cronológico pela intensidade que é posta na sua vivência.
É este o desafio de todos nós e não apenas dos infectados com o HIV.
O medo é a essência da nossa coragem por isso façamos do medo a razão da nossa luta. E disse "nossa" porque recuso que haja uma luta para os seropositivos e outra para os que o não são.

Abraço

Fábio Savelha disse...

Olá,
antes de mais obrigado pela visita ao blog e pelo comentário. Gostei imenso dos blogues e acima de tudo admiro a capacidade de expor uma situação tão delicada como a temática da Sida. É sem dúvida alguma a "doença do medo". Desconhecida por muitos, ignorada por outros tantos e os que restam sofrem em silêncio as amarguras e o sofrimento que a solidão inerente a quem está infectado acarreta. É importante divulgar. É importante dar o nosso testemunho mas essencialmente é importante falar sem receio de o fazer porque sem tem vontade e porque se está vivo para o fazer. Visita-nos e sempre que sintas vontade deixa comentário.

Abraço
Fábio

Unknown disse...

Olá Raul,
o Ser Humano é realmente muito complexo, ser portador do HIV não é de todo sinónimo de morte. Morrer vamo todos um dia, nada temos tão certo na vida.

Beijinhos,
Ana Martins

Alexa disse...

As fotografias estão espectulares.
abraço

Eme disse...

Viver também é morrer lentamente.

e está tudo dito. Não vale a pena falar do medo de algo que é comum a todo o ser humano, sem excepção, a menos que exista a imortalidade sem eu saber. O destino final é o mesmo para todos, excluindo as fatalidades. Ninguém gosta de pensar como serão os últimos meses, dias, horas ou segundos uma vez que se associa sempre sofrimento à morte. De resto, morrer é apenas ir ao encontro de algo longamente adiado.

E viva-se a vida enquanto ela é.

Abraços

Odele Souza disse...

Todos estamos sujeitos a morrer a qualquer momento, tenhamos ou não a SIDA. Hoje, com os medicamentos que existem um infectado poderá viver tanto ou mais que um não tenha a doença. E viver é mesmo morrer lentamente, não só para os infectados como pra todos nós. O que precisamos isto sim, é enquanto a vida pulsar em nós, vivê-la com a melhor qualidade possível. O resto é tocar a vida pra frente, da melhor forma que pudermos. E estar em contato com outras pessoas, trocar experiências, conhecimentos e afetos é uma boa maneira de "tocar a vida"

Um forte abraço pra ti.

Dr. Mento disse...

É um texto impressionante, sem dúvida. E nada mais consigo acrescentar.

Raul, uma vez mais, obrigado por partilhares estas experiências connosco.

isabel mendes ferreira disse...

não consigo imaginar o que seja viver com a espada assim tão afiada...mas sei que a vida é apenas um fio. seja de aço ou de espuma.
à ciência cabe "saber depressa" o fim da dita e a nós cabe-nos a generosidade de viver com dignidade.


seja com ou sem "espadas".


o meu abraço.


grato.

José Lopes disse...

Aprender a viver com Sida e com todos os outros perigos que a vida moderna nos trazem.
São muitos os perigos que podemos diagnosticar nos nossos dias, importa saber evitar o que se possa evitar, curar o que pode ser curado, e controlar o que ainda não tem cura.
Todos nós sabemos que o final da vida é a morte, o que não quer dizer que abdiquemos de viver o melhor possível.
Cumps