O[s] dia[s] seguinte[s]


O dia mundial da SIDA já passou e até ao próximo vai ficar tudo caladinho, exceptuando uma ou outra noticia que a comunicação social amarela ache que vai ser lida sobre um novo medicamento blá blá blá, e que logo a seguir ninguém mais fala. A imprensa rosa, caso alguém com notoriedade revele encontrar-se infectado, também falará. De resto a SIDA ficará votada ao esquecimento da maioria da população e seguida permanentemente por aqueles que vivem com ela.
Um ou outro estudo pago a preço de ouro, conclui o que todos já sabemos: a pandemia continua a alastrar. Os Doutos senhores donos do controle da Pandemia pensam que é preciso fazer algo. Como a imaginação e os caminhos que possam conduzir a uma solução são parcos, tendem a seguir as soluções anteriores, que não surtiram efeito como se comprova facilmente. Fazem-se filmes, contratam-se uns criativos que sobre a sida pouco sabem e a ideia de morte, sofrimento ou medo saem de novo à rua. Mais um balúrdio em fundos mal aplicados que enchem as algibeiras de alguns e o contentamento de terem justificação para fazerem o povo pensar que cumpriram o seu dever e que se cada vez há mais VIH positivos a culpa não é deles: “ Nós informamos mas o povo não quer saber…. Não é por falta de informação” - dirão para uma entrevista a um meio de comunicação de massas.
Passou uma reportagem em meio hospitalar com uma médica espanhola (os médicos portugueses estão em vias de extinção) que apreciei muito. Os auxiliares de acção médica deixam muito a desejar nas suas afirmações, mostram algum desconhecimento mas lá tiveram o seu momento de protagonismo. Os produtores ou o realizador deixaram-se levar pelo cenário vigente do passado que mostram os casos de SIDA em meio hospitalar, imagens pouco agradáveis que mesmo protegendo o rosto dos internados deixa uma mensagem bem clara para os governantes: “ O problema da SIDA e do seu alastramento é basicamente um problema social e não clínico. No momento em que esse problema social for resolvido o número de novas infecções cairá drasticamente.”
Desconheço se houve o show dos anos anteriores, em que os notáveis eram mostrados e que de sida ou em referência a ela pouco tinham. A SIDA saiu à rua numa espécie de mini carnaval de um só dia e os foliões já despiram os seus fatos preparando-se para aparecer no próximo ano. E dentro de um ano existirão novos infectados para os quais a sida e o dia que a lembrou passou despercebido, e que desta vez será a sua nova realidade.
Continuarão os desperdícios de dinheiro, que supostamente deveriam ir para o apoio social aos infectados e que não vão. Continuarão a aparecer projectos e estudos idiotas que serão aprovados e financiados pelo estado, o qual não se achando com capacidade, por não ter estruturas sociais para esta área tem pelo menos o dever de saber para onde vão os milhões gastos, pois não o fazendo está a roubar todos os contribuintes e a não permitir que esses fundos sejam aplicados numa melhoria de vida dos infectados, que por sua vez melhorariam a sua auto estima, a qual levaria a que tomassem consciência da necessidade da medicação e a tomassem, o que como consequência reduziria as suas cargas virais dando-lhes mais saúde e tornando-os agentes não infecciosos. A prostituição devido a carências de ordem social por parte de infectados desapareceria e isto certamente seria um passo em frente.
O dia mundial da SIDA, inaugura o CIRCO DO SOL, relembrando as festividades pagãs. Acabará com fogos de artifício, bebedeiras e o barulho do bater no fundo das panelas quando o ano mudar. É a época de todo o mundo brilhar, mostrar a sua bondade e caridade sazonal, para logo de seguida a guardar por mais um ano no baú.
Este meu desabafo de pouco ou nada servirá, mas no fim do circo, certamente irei bater com todas as forças que tiver o fundo da minha panela, na esperança de que alguma da caca de galinha que por lá está agarrada, na forma de miolos dos senhores do mundo se solte, e possamos ter um mundo mais saudável sem tantos parasitas à nossa volta.

21 comentários:

Fatyly disse...

ESte teu desabafo doeu-me muito pela sua triste e vergonhosa veracidade.
Os dias de... só servem para..., mas durante os restantes 364 dias a sociedade em geral pouco ou nada faz em prol do quer que seja.
Mas deixa-me dizer-te meu amigo, que hoje estamos bem melhor do que ontem, porque apesar dos pesares há quem esteja horas e horas em laboratórios a lutar e a estudar o "estafermo do virús" que devido à sua complexidade e mutação tem dado àgua pela barba.
APostou-se mais na informação e agora há que apostar na prevenção já que a informação chegou mas os comportamentos nomeadamente na camada mais nova e na da minha geração ainda tem muito a desejar porque e aqui deixa-me dizer-te algo que sinto: poderá haver informação/prevenção de porta a porta, mas o nível cultural de absorção dessa informação demorará décadas, porque a mentalidade é das coisas mais dificeis de mudar.
Oxalá esteja enganada, mas quando oiço dois jovens, nos gritinhos de risos próprios da idade da parvoeira, dizerem: oh pá eu sei o que é a sida, mas, sabes pá...esqueçemo-nos por vezes do preservativo. A juntar a isto há o factor alcool que ainda lhes tolda as ideias...numa de tá-se bem meu!.

Em vez de nos porem na caixa do correio resmas de publicidade de vendas de produtos de todas as qualidades e feitios, deveriam essas mesmas empresas sensebilizarem-se, unirem-se e distribuirem folhetos com brinde(um preservativo) que essas que trazem sempre algo nunca são deitadas fora.
Nas campanhas eleitorais igualmente deveria aproveitar-se anexando algo para alertar a perigosidade do HIV, das hepatites e até da tuberculose.

Sonho com o impossível? nada é impossível e basta estarmos atentos às noticias para ver o resultado da MOBILIDADE7UNIÃO DE UM POVO.

Beijos Raul e a luta continua.

(desculpa a extensão/desabafo)

mundo azul disse...

Um triste desabafo para um problema real, do qual poucos se dão conta...

Beijos de luz e carinho, meu amigo!

sideny disse...

raul
Embora hoje em dia os medicamentos sejam mais suave,nos seus efeitos secundarios, continua-se a passar a imagem de doentes com hiv nos hospitais.
tambem vi o a reportagem da medica espanhola, e das auxiliares do hospital.
mas como ninguem da a cara para mostrar que somos iguais a qualquer outra pessoa, ficamos na mesma como a lesma:(
enquanto houver discriminação para os doentes de hiv, ninguem dá a cara.
beijocas

Biby disse...

Olá Raul!
A médica espanhola de que falas chama-se Drª Josefina e foi minha colega de mestrado juntamente com outros profissionais do Hospital Joaquim Urbano, um hospital que na minha opinião merece ser conhecido pelo seu excelente trabalho nos cuidados aos infectados por VIH. Tenho andado por lá nos ultimos dias a convidar pessoas para o meu estudo e tenho ouvido os maiores elogios por parte dos utentes que são lá seguidos, consideram que é dos poucos sitios onde são tratados com dignidade e respeito.
Infelizmente este tipo de reportagens deveria passar mais vezes já que durante todo o ano são raros os anuncios que vejo na TV sobre a SIDA. O dia mundial de luta contra a SIDA deveria ser todos os dias e não um unico dia no ano que acredito que passou despercebido a muita gente.
Deixo-te um beijinho e um sorriso :)

SILÊNCIO CULPADO disse...

Raul
Com uma crueza acutilante lá vais pondo o dedo na ferida.
Sinceramente o dia disto ou daquilo não me diz nada. É como o Natal. Não passa tudo de fogo fátuo. Mas, mesmo assim, não deixa de ser uma chamada de atenção e uma oportunidade para se dizer alguma coisa.
Entretanto o esquecimento é só para quem quer esquecer. Nós estamos aqui exactamente para lembrar e assim iremos continuar e havemos de chegar lá aonde queremos.
Posso ser uma optimista pateta mas acredito que a solução para o HIV estará para muito breve.
A foto que escolheste é sensacional.

Abraço

setesois disse...

Olá boa noite
Percebo a tua indignação, revolta, … o que lhe queiras chamar, mas se todos nós anónimos fizermos alguma coisa essa revolta vai ser muito menor, eu não faço muito devo dizer, mas faço uma esforço para o fazer, não faço mais ou porque não sei ou porque não posso mesmo.
Tento divulgar este teu blog o mais que poder. Faço publicidade quanto mas posso dizendo a amigos para visitar este grande espaço de informação e onde se pode aprender muito e divulgar as varias ou algumas formas de luta contra este maldito vírus, e façam como eu divulguem, no MSN, podem meter lá o link em jeito de mensagem, vai sempre aparecer mais um aqui no blog e assim construirmos uma grande bola de informação, quanto á reportagem, eu conheço o hospital em causa, e só tenho a dizer maravilhas, mas mesmo na reportagem, ainda que tenha o seu quê de show, dá para ver que tem lá grandes profissionais. O facto de os doentes não darem a cara a culpa é mesmo nossa porque os descriminávamos logo, ( quando digo nós, quero dizer nós a sociedade de uma maneira geral), muitos ficariam sem emprego e seriam visto de outra forma até na rua, até porque a cidade do porto é muito pequena muito mesmo,
Bom por fim só nós é que podemos fazer muito para travar esta pandemia tendo comportamentos saudáveis, e dando a mãos para a maior informação sobre a doença,
Um bem-haja e desculpa se não me faço entender.
Um abraço caloroso
Fernando Moreira

amigona avó e a neta princesa disse...

É sempre importante lembrar...a luta também se faz de pequenos passos...um abraço amigo...

R.Almeida disse...

Fatyly
As festas do solsticio continuam nos tempos modernos, mais refinadas mas nem por isso menos crueis.Os gladiadores na arena e os cristãos à mercê das feras eram simples aperitivos comparados com o que vemos hoje em dia. Apenas e devido ao [não]desenvolvimento das sociedades todas essas remanescências do passado são envolvidas em bonitas embalagens que não deixam ver o que está lá dentro.
Gostei da tua veia revolucionária, espero que tenhas a força que a mim já me vai faltando para continuar a lutar.
Beijos

R.Almeida disse...

Mundo Azul
Gostaria de ver o mundo da mesma cor que tu, e com toda a tua poesia, no entanto sinto que muitos o asfixiam e vejo-o roxo.
Toda a luz e todo o carinho para ti querida amiga.

R.Almeida disse...

Querida Sideny
O problema até nem está em dar a cara.As conversas na reportagem e o que se via e ouvia mostram a necessidade das entidades responsáveis verem a SIDA como um problema social primeiro e só depois darem atenção à parte clinica. Tu sabes, eu sei e tantos outros companheiros sabem a dificuldade com que mantemos a cabeça fora de àgua para continuarmos a respirar. Sei que tu, assim como eu conhecemos pessoas maravilhosas, muitas das quais já cá não estão que seguiram outro rumo por não terem apoio social que lhes desse uma vida humilde mas minimamente digna de um ser humano. Não digo mais e guardo o resto cá dentro. Beijocas

R.Almeida disse...

Cara Isabel (Biby)
Ainda bem que tens andado por lá, e com a tua formação se deres atenção aos problemas sociais dos internados e consegires aprofundar um pouco o que é a vida de cada um deles, fácilmente chegarás à conclusão de que a SIDA é básicamente um problema social e não um problema clinico. Sem resolverem o problema social o alastramento da pandemia não parará de crescer.Felicidades e gostaria de ter ver como activista lutando a nosso lado por uma causa em que acreditamos ter solução para ela. Que haja gente de boa vontade nesta luta. Bjs

R.Almeida disse...

Lidia
De pateta não tens nada, mas és uma optimista muito querida. Os dias disto, daquilo ou de daqueloutro são apenas chamadas de atenção para os problemas existentes. Neste caso dia de protagonismo para muitos senhores
SIDA, que de sida nada têm a não ser o poder de fazer algo e que nada fazem.
Ladramos enquanto a caravana passa aparentemente alheia ao nosso latir. De vez em quando damos uma mordidela na pata de um camelo e aí incomodamos. Beijo Grande

R.Almeida disse...

Ola Fernando (7 sois)
Foste entendido sim. A luta não é só de um mas de todos nós.Um rio é constituido por muitas gotas de água e é assim que nós queremos crescer. Se cada um de nós dedicadamente nos colocarmos lutando por esta causa, o nosso trbalho poderá ter eco e travar a pandemia. Todos não somos demais nesta luta.
Um abraço

R.Almeida disse...

Amigona Avó e neta
Tens razão a luta faz-se de pequenos passos. Ajuda-nos a caminhar, caminhando ao nosso lado. Olhamos para ti com o mesmo confiar que os nossos netos nos vêem, com a certeza da tua experiência e sabedoria na aprendizagem que desejamos.Um abraço terno

f@ disse...

Olá Raul… Que se abra o baú e o Circo do Sol faça o brilhar as mentes + escurecidas e os corações de pedra aqueçam para nunca o silêncio e/ou o esquecimento deixar desfazer os laços e os abraços que apertam a luta, o amor, o carinho…
O solstício só tem sentido com uma fogueira e uma dança de roda de mãos dadas…

Beijinho silencioso das nuvens

R.Almeida disse...

F@
Infelizmente o Circo do Sol, é um carnaval fora do tempo, ligado aos ensinamentos da Santa Má Igreja, intimamente ligada ao governo S...ista, em que o clero tinha uma força muito grande e ficava bem praticar a caridade nesta época (mesmo que fingida)para se ganhar o céu e algo mais. Mudam-se os tempos mas não se mudam as mentalidades nas ditaduras ardilosas e enganadoras em que quem melhor mente leva os votos.
Eu e o meu mau feitio..... mas porque hei-de eu dizer o contrário se aquilo que me dizem ser bom me sabe a fel???
Beijos Pikena e tu sabes que cá de cima das nuvens a gente vê tanta coisa que não gosta lá em baixo.

f@ disse...

Raul e eu que adoro circo... o circo da fantasia e da magia dos sentidos... não esse que nos passam todos os dias os palhaços sem graça do espectáculo de artimanhas e mentiras...
Não é mau feitio dizer o que sentimos, quando ainda temos a razão e a verdade do nosso lado...
...
Beijinhos até às nuvens

. intemporal . disse...

Viva Raul

Fantástico este teu post, escrito literalmente "à tua maneira" que traduz inequivocamente a hipocrisia reinante na gestão de uma sociedade empobre[SIDA] pelo faz de conta!

Fantástica a alegoria com que te acometes ao rochedo, onde a pedra é sempre dura e abrupta!

Um abraço

Odele Souza disse...

Entendo teu desânimo pois por vezes também me sinto assim: Desanimada. Defendemos uma causa, procuramos chamar a atenção para ela, mas a mídia de massa está mais interessada em "outros assuntos". E parece que só
nos resta "bater panelas". Pois que seja. Vamos BATER PANELAS e GRITAR, mesmo que a voz nos doa. Com a esperança que um dia alguém haverá de nos ouvir. Porque no fundo, bem lá no fundo de nós, é a ESPERANÇA que nos mantém vivos.

Branca disse...

Olá Raul,

Fantástico o teu texto, revoltado, acutilante, mas é o espelho da pura verdade.
Trabalho na Administração Regional de Saúde do Norte, sediada no Porto, onde se pôs um cartaz, na frontaria do edifício, sobre o Dia Mundial da Sida, mas não vi fazer mais nada, nem sequer falarem no assunto. Ficou lá um fim de semana, silenciosamente e silenciosamente foi retirado no dia 2.
Mas, este é um país de faz de conta, nesta e noutras questões. Fazes muito bem em não te calares, vamos na medida do possível fazendo algum barulho, catagiando aqui e ali aqueles que quiserem aprender algo mais. Tu és o grande exemplo de que isso é possível, através de ti temos todos aprendido imenso e aqui continuamos na esperança de que outros se possam aperceber de que a SIDA não é apenas aquelas imagens tristes em camas de hospital, que nos impingiram em campanhas publicitárias e que só ajudaram a afastar ainda mais alguns medrosos da verdadeira dimensão do problema.
Desejo que continues a recuperar bem da tua intervenção.
Mil beijinhos
Branca

mariam [Maria Martins] disse...

Raul,

muito bom post!

a sociedade é hipócrita, mesmo!
não só no caso da Sida,,,, do Natal, do aborto, dos(as) homossexuais, do racismo, do marginalizar o outro porque não é igual ou aparentemente igual, camuflado todo esse sentimento por campanhas, discursos televisivos, gente do triste "jet set" a dar a cara, por causas em que é notório que de resto nem percebem nada do que se trata, apenas sorriem e recebem uns trocos(me desculpem as excepções), e até nas conversas informais, de gente comum, do género, "aceito aceito, e estou solidário, desde que não seja com alguém que me seja próximo" ... enfim, Raul, humano é assim mesmo, de "ser humano" por vezes tem pouco...
sorry a divagação... :)


boa semana
um grande sorriso :)
e MELHORAS!

mariam